Desde março deste ano, o Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) iniciou o pagamento de um novo benefício a juízes e desembargadores do órgão que em três meses já onerou aos cofres do judiciário de Sergipe cerca de 6 milhões de reais.
A gratificação, chamada pelo TJSE de licença compensatória, com natureza indenizatória, obedece a seguinte engenharia: a cada três dias de trabalho, os magistrados adquirem um dia de folga. Essas folgas são acumuladas em até dez dias por mês e, automaticamente e por tempo indeterminado, compradas pelo próprio TJSE na proporção de um dia de salário por cada dia de folga. Na prática, isso representa um acréscimo de 1/3 nos salários dos juízes e desembargadores sergipanos.
Quando o benefício foi criado, o Tribunal de Justiça arugumentou que ele substituiria a, hoje extinta, gratificação de acervo processual e que, por isso, não haveria aumento de despesa – vale lembrar que essa gratificação substituiu o auxílio morádia, cujo pagamento indignava a sociedade brasileira.
Mas não foi bem assim. Em três meses, o TJSE já gastou R$ 5.909.124,66 com os cerca de 160 magistrados. Já entre os meses de dezembro de 2023 e fevereiro de 2024, o desembolsou R$ 2.572.289,00 com o pagamento do acervo. Comparando os períodos, verifica-se um aumento de R$ 3.336.835,66, ou seja 130% a mais em gratificação.
Nestes primeiros três meses, a média de recebimento dessas folgas ficou em R$ 11.794,31 mensal. Na gratificação de acervo processual, a média era de R$ 5.525,54. Esse valor de R$ 11 mil é superior aos salários de todos os agentes, técnicos e analistas judiciários do TJSE que não ocupam cargo em comissão (CC) ou função de confiança (FC).
Teto Constitucional
Por não fazer parte da remuneração salarial, a troca da gratificação do acervo para a compra de folgas fez com que fosse furado o teto constitucional do serviço público, que hoje é de R$ 44.008,52 – equivalente ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Em consequência, não há incidência de Imposto de Renda Pessoa Física na indenização.
O pagamento das folgas é considerado “despesa com pessoal”, ou seja, tem natureza remuneratória. Quem diz isso é a 14ª edição do Manual De Demonstrativos Fiscais da Secretaria do Tesouro Nacional. Com isso, esse gasto precisa ser custeado com as receitas oriundas do tesouro estadual, recebidos mensalmente pelo TJSE através do duodécimo.
A consideração dessa despesa como de pessoal interfere nos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n° 101/2000), afetando as possibilidades de revisões e reajustes dos servidores do TJSE.
Outros problemas
Na justiça estadual sergipana, a criação e compra das folgas dos magistrados foi instituída pela Lei Complementar Estadual n° 406/2024 e regulamentada pela Resolução n° 10/2024 do Pleno do TJSE.
O Tribunal de Justiça, porém, parece ter copiado quase ao pé da letra a Resolução n° 847/2023 do Conselho da Justiça Federal (CFJ), inclusive vinculando equivocadamente os magistrados estaduais ao Estatuto dos Servidores Públicos Federais no art. 3º da Resolução n° 10/2024 da corte estadual.
Mas há algumas diferenças. Os juízes federais precisam apresentar requerimento específico para conversão das folgas em dinheiro. No TJSE, essa conversão é automática e por tempo indeterminado.
Porém, algumas peculiaridades continuam sem explicação. Como o TJSE vai auferir que os magistrados estão trabalhando e realmente terão direito à folga e respectiva indenização? Haverá controle de ponto dos juízes e desembargadores? E quando o membro estiver gozando uma outra folga, como a decorrente do plantão judicial, esse dia será abatido do cálculo indenizatório?
Fonte SINDIJUS Sergipe